domingo, 6 de novembro de 2011

Nu artístico





















Leio o jornal da última para a segunda página, mas só depois de ter visto a primeira. O meu último defeito foi ter colocado a colher e o prato da sopa na máquina de lavar e não me ter lembrado que estava de gravata. O meu último prazer foi o som da lâmina da faca com cabo de madeira ao tirar a casca de uma maça Fuji vermelha, dura, suculenta. A minha próxima vontade é ler o artigo de uma revista de domingo sobre os inspectores da polícia judiciária. A minha última leitura foi as três páginas do testemunho de uma mulher, da qual agora não lembro o nome, sobre Rafael Barrios n´Os Detectives Selvagens. O meu último capítulo do amor pelas coisas simples é o de amar de perdição quem teve a ideia de juntar numa só peça as palavras pijama, xadrez e algodão. O meu último trabalho foi sobre a dificuldade dos homens perante um cenário de luz apagada. A minha última viagem foi uma distância de 20 quilómetros. O meu último destino foi esta casa. Cheguei. Espreitei o jornal numa folha de vidro. Comi a sopa toda, tratei da louça, mas devia ter tirado antes a gravata, vesti um pijama que é o verão encostado ao corpo, comi uma maça vermelha, escrevi numa maçã cinzenta em alumínio.

(a foto não é um hospital. É a Faculdade de Psicologia do Porto em dia de congresso organizado pelo Bloco de Esquerda)

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