domingo, 2 de outubro de 2011
Coisas que estes senhores nunca vão saber
Que na carruagem com o número vinte e um, um alentejano reformado, culpa os talibãs se o comboio abranda e culpa os talibãs se as curvas são muito curvas. Culpa os talibãs se o comboio se atrasar, e se ele, inocente por causa da culpa dos talibãs, chegar atrasado ao almoço para o qual foi convidado pelos familiares do "rapaz" da "rapariga", a filha. E quando o comboio pára na linha, avariado, algures nas proximidades de Ourém, ele lá diz que depois a culpa é dos talibãs. Esteve a um talibã de levar um murro na tromba. Mas entretanto o comboio começou a andar.
Estes senhores nunca vão saber que o relógio da rapariga de cabelos encaracolados, em viagem no banco da frente, é reflectido nitidamente no vidro nas zonas de sombra e parece um fantasma das horas ao sol. Nem vão saber da fita amarela amarrada com um nó no pulso esquerdo.
Que a senhora professora vai perder um seminário na fundação Cupertino de Miranda, no Porto, e que o rapaz moreno de barba escura vai perder a ligação em Coimbra para uma cidade mais no interior.
Que minutos antes deste momento terminou o primeiro episódio de uma série sobre aparição de um soldado dos Estados Unidos, detido pela Al-Qaeda e desaparecido há oito anos no Iraque.
Que um telefone à janela estava tirar esta fotografia ao relógio da estação quando o intercidades parou com uma hora de atraso. Que o título ia ser as coisas que estes senhores nunca vão saber. Que só foram o título desta passagem por Pombal porque estavam ocasionalmente no enquadramento do relógio.
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